O que me impressiona no
capitalismo é a sua capacidade de se inventar empregos. Nunca se viu ou verá entre
outras sistemas econômicos tanta oferta de trabalho formal e, principalmente,
informal. Essa é a grande proeza do capitalismo: incentivar a criatividade para
sobreviver. Duvido que o socialismo seja capaz de ofertar tantas alternativas. No
creo! No meu imaginário, os socialistas só são capazes de produzir funcionários
para estatais, proletários, camponeses e frustrados. Já no capitalismo qualquer
merd. é adubo para dinheiro, gerando
outro emprego dependente e até carteira assinada. Claro que essa argumentação arrepia
os sociólogos. É senso comum. Mas o povão, grande artista da fome, não enche a
barriga com teorias.
Para minha alegria, presenciei a invenção
de mais uma forma de sobrevivência e a sua complexa estrutura de funcionamento.
Estava na BR-277 com vistas a me dirigir ao centro de Curitiba quando um
indivíduo se aproximou e se ofereceu para acenar ao ônibus em meu lugar. Não
entendi a sugestão. Chamar o ônibus para mim? Eu conhecia a modalidade de
emprestar a unidade do cartão transporte por um preço mais acessível, reforçando
uma fraude comum, como ocorre muito no Terminal Guadalupe. Mas apenas tomar meu
lugar pra chamar o ônibus? Logo naquela parada que leva a todos em direção ao
centro da cidade?
Contudo, a sua resposta trouxe um
viés interessante: “É pra diminuir o istréis, chefia. As pessoas andam tão
cansadas que não prestam atenção no busão ou reclamam de ter que levantar a mão
pra sinalizar”. Não é mentira. Se estivesse no Rio ou em São Paulo, o mesmo
ponto de ônibus poderia levar a bairros e ruas distantes umas das outras,
obrigando os passageiros a terem uma lista com o número do ônibus e os locais
que eles percorrem. Só que em Curitiba, na BR-277, próximo ao Mercadorama,
todos vão para o Guadalupe, Carlos Gomes ou Rui Barbosa. Talvez, a preguiça que
ele sugira tem a ver com as estações tubos, onde não é necessário acenar ou
ficar muito atento ao nome do ônibus.
Mesmo assim, o ‘acenador’ seguiu vendendo
o seu serviço, uma vez que percebeu uma fatia de mercado. Até elaborou uma
tabela de preços para o serviço atrelado, obviamente, ao preço dos ônibus. O vermelho
metropolitano é mais barato, o amarelo municipal está no meio e pelo
intermunicipal branco se cobra mais caro. Ele ainda oferece dois tipos de
serviço: econômico e luxo. No primeiro, ele apenas solicita a parada do ônibus após
solicitação do passageiro. No serviço luxo, ele fica atento à aproximação da
linha desejada e assinala ao transporte.
Mas não pensem que para por aí. A
linha de trabalho informal é mais ampla. Após os passageiros partirem, o empreendedor
daquele ponto confessa que é apenas mais um empregado. Além dele, existem outras
pessoas desempenhando outras funções. Uma delas é o cargo de guardador de fila,
desenvolvido em terminais de ônibus e na Praça Rui Barbosa. Cobram-se dez
centavos a cada cinco minutos para ficar na fila. A rotina dura doze horas, mas
é lucrativa, pois os coletivos nunca chegam no horário. Também é na Praça Rui
Barbosa que fica o idealizador desta atividade: Zé Bueiro. É justamente com ele
que vou me encontrar. Aliás, vi-me obrigado a conhecê-lo. Quem sabe Zé Bueiro
não planeja uma nova atividade, confirmando o marginal esplendor do
capitalismo. Revelações para as próximas crônicas.
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Manolo Ramires
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